Começamos o ano com uma análise prática sobre a notícia da sub-rogação das seguradoras de crédito em processos de Recuperação judicial.
A esta altura, o leitor dos informativos do HSA Law já deve estar cansado de saber que, uma vez paga a indenização securitária pela seguradora de crédito, há sua imediata sub-rogação em face do crédito antes detido pelo segurado.
Isto quer dizer que aquele crédito antes devido ao segurado por determinado comprador passa a ser de titularidade da seguradora, até o limite dos valores indenizados.
Este texto pretende analisar os passos necessários para que as seguradoras de crédito possam ter o seu direito creditório reconhecido quando o comprador devedor, que originou a indenização, está em recuperação judicial.
Na recuperação judicial, o devedor deve apresentar sua lista de credores e uma vez deferido o processamento da Recuperação Judicial (ou seja, autorizado o início do procedimento de recuperação judicial), os credores terão o prazo de 15 dias para discutir a lista apresentada pela empresa em Recuperação Judicial, seja para reclamar a inclusão de seu crédito, seja para contestar os valores listados ou classificação deles. Esta fase é administrativa porque não depende de peticionamento nos autos e deve ser enviada diretamente ao Administrador Judicial.
Como o crédito original é devido ao segurado, é natural que a empresa em recuperação judicial liste o crédito em nome dele e não da seguradora.
Em seguida, após analisar os pedidos de habilitação ou divergências de crédito administrativas, no prazo de 45 dias, o Administrador Judicial deve apresentar sua lista de credores. Inicia-se, então, o prazo de 10 dias para que os credores ou empresa em recuperação judicial possam, judicialmente, discutir esta segunda lista de credores.
O que ocorre, então, quando a seguradora de crédito paga a indenização durante o curso destes prazos, ou, por exemplo quando já finalizaram todos os prazos descritos acima? Neste caso, o crédito da seguradora deve ser considerado retardatário (com as consequências que advém desta situação, como pagamento de custas judiciais e impossibilidade de exercício de voto do Plano em eventual Assembleia Geral de Credores) ou a alteração da titularidade do crédito da seguradora independe do cumprimento destes prazos e deve ser simplesmente declarada pelo juiz?
Importante lembrar que, no mais das vezes, o pedido de recuperação judicial é um dos eventos de sinistralidade, ou seja, é o pedido de recuperação judicial que justifica a notícia do sinistro pelo segurado, com abertura do processo de análise de cobertura, sendo que, em geral, as seguradoras possuem 30 dias do recebimento do aviso de sinistro ou de documentos complementares, para concluir pela cobertura securitária e os valores, eventualmente, cobertos.
É, portanto, natural que a análise de cobertura securitária e pagamento da indenização perdure por muito mais do que os 15 dias para habilitar extrajudicialmente seu crédito, no mais das vezes, ultrapassando, até mesmo, o prazo de impugnação judicial (10 dias).
Por isso, entender que a simples alteração de titularidade de um crédito existente (em nome do segurado) demandaria habilitação/divergência administrativa ou impugnação pela seguradora de crédito seria o mesmo que reconhecer que seu crédito será sempre retardatário, o que, obviamente, não seria razoável e impediria até mesmo a continuidade da atividade de seguro de crédito (pois representaria entrave desarrazoado para tal setor).
Me parece, portanto, que simples petição noticiando a alteração de titularidade do crédito nos autos da recuperação judicial, sem discutir efetivamente os valores listados, seria suficiente para que o crédito das seguradoras fosse reconhecido.
Fundamentando este entendimento, basta analisar o artigo 39, §7º, da Lei 11.101/05 (LRF), segundo o qual “a cessão ou a promessa de cessão do crédito habilitado deverá ser imediatamente comunicada ao juízo da recuperação judicial.” É evidente que a sub-rogação não se confunde com a cessão, são institutos diversos, mas por analogia é possível aplicar o mesmo entendimento à sub-rogação, já que, em ambos os institutos, há simples transferência de titularidade de crédito já reconhecido e, esta transferência, em geral, ocorre quando já transcorridos os prazos para discussão do crédito.
Para as seguradoras, o reconhecimento da sub-rogação é essencial, pois assegura (a) direito de voto do Plano de Recuperação Judicial, com possibilidade direta e objetiva de renegociar seus termos e condições; (b) recuperação do crédito de forma independente ao segurado.
Por fim, nunca é demais relembrar que, se há discussão quanto ao crédito habilitado, seja em termos de valores ou classificação, esta pode ser um fundamento para as seguradoras suspenderem a cobertura (pois, há disputa sobre os valores inadimplidos), cabendo aos segurados tomar todas as providências para correção do crédito (ai sim, apresentando divergência/habilitação administrativa e/ou impugnação de crédito), sendo que apenas a solução sobre esta questão autorizará o prosseguimento da análise de cobertura pelas seguradoras.